11/09/2018

A ÚLTIMA VIAGEM DO ELÉCTRICO

O dia 11 de Setembro do Ano da Graça de 1993, passará a constituir um dia negro para Matosinhos, com o fim do eléctrico, nomeadamente do “19”, meio de transporte que durante décadas e décadas foi uma referência da cidade e do concelho. No passado sábado, a coincidir com um dia cinzento, os matosinhenses viram partir o “amarelo”. Nós viajamos no último eléctrico “19” até à Circunvalação, limite de “fronteira” com a urbe portuense. Não deixamos de sentir uma profunda tristeza ao descer “dessa casinha com muitas janelas”, que nos deslumbrou na meninice, na ida para a praia de Leça, ou para a “Emília Barbosa”, de gratas recordações.

O último “19”, com a matrícula L-23-nº 223, saiu de Matosinhos (junto do Mercado), às 21 horas e 10 minutos, recolhendo a Massarelos. Como guarda-freio, José de Sousa, que há 4 conduzia, depois de mais de 20 anos de cobrador. O revisor (cobrador), foi António Mendes Gonçalves, natural do Marco de Canaveses, que há 22 anos desempenhava aquelas funções. Pode-se afirmar que foi uma viagem dolorosa. Os passageiros não deixaram de criticar asperamente a decisão tomada pelos STCP, para os quais os motivos económicos se sobrepõem aos de índole afectiva e sentimental.

Na Circunvalação, despedimo-nos dos funcionários dos STCP. José de Sousa, principalmente, era um homem emocionado. Apertou-nos fortemente a mão, enquanto teimosa lágrima lhe aflorava ao rosto. Durante o curto trajecto, os dois homens recordaram o tempo em que os eléctricos circulavam em toda a cidade. Quanto ao “223”, foi construído em 1939, na então Oficina da Companhia de Carris de Ferro do Porto.

Entretanto, na Brito Capelo, foram colocados avisos a dar conta do fim do “19”, substituído por autocarros que, no Castelo do Queijo, recebem os passageiros do “1”, que também deixou de vir a Matosinhos. Ao ler esses avisos, os matosinhenses quase não queriam acreditar no que era irreversível, fazendo comentários nada abonatórios contra os STCP, “metendo” pelo meio a Câmara, que, em seu entender, nada fez para salvaguardar esse transporte que marcou gerações. Enfim: acabou o eléctrico, e Matosinhos ficou mais pobre culturalmente. Será isto progresso?


(JOSÉ VIDEIRA, in Jornal de Notícias, 1993.09.17)



21/04/2018

CINEMA YORK

O ano de 1995 ficou marcado por uma verdadeira guerra religiosa contra a IURD (Igreja Universal Reino Deus). A contestação teve o seu ponto principal em Agosto, quando uma seguradora se preparava para entregar, à referida Igreja, as instalações do Coliseu do Porto. Num verdadeiro gesto de cidadania vários ilustres da cultura, política e cidadãos anónimos manifestaram-se e conseguiram recuperar a dinâmica e uma referência cultural da cidade.

Em Novembro do mesmo ano, a contestação chegou a Matosinhos. As pessoas mobilizaram-se para conseguir recuperar as instalações do "Cinema York", na Rua Alfredo Cunha que, até então era utilizado não para os filmes mágicos de Hollywood, mas sim, para as sessões de culto em língua brasileira. Os ânimos exaltaram-se dando origem a actos de violência, mesmo com a intervenção policial e apelo à calma pelo Presidente da Câmara Narciso Miranda, em funções naquela altura.

A SIC, através do programa "Perdidos e Achados", recordou algumas imagens e depoimentos do que se passou em 1995 com depoimentos de alguns cidadãos quinze anos depois. Quero deixar claro que esta publicação não se trata de qualquer ataque ou juízo de valor à referida Igreja. A partilha pretende apenas recordar imagens (e testemunhos) do passado da cidade de Matosinhos.
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06/06/2017

STA. CRUZ DO BISPO, um olhar

A vida quotidiana das pessoas que partilham a vizinhança com os pesos pesados da indústria. Nomeadamente os camiões, contentores e centrais eléctricas. Mário Antunes mostra o cenário de guerra em que se transformou Santa Cruz do Bispo, Matosinhos…
 
Alegre e bem-disposto. É assim que Mário Antunes recebe quem quer saber mais sobre Santa Cruz do Bispo. É o seu local de residência há mais de quatro décadas. A sua cronologia mistura-se com a do lugar. Por ele combateu e enfrentou as sucessivas forças políticas que não partilham a sua visão. O tempo provou que estava certo. Actualmente, a sua terra, está esquecida, abandonada por más decisões administrativas que deixaram os moradores – de um sítio pacato, encantador e carregado de história – a partilhar espaços com grandes parques para contentores e edifícios de apoio logístico e uma central eléctrica instalada numa rua principal.
 
Santa Cruz do Bispo é uma freguesia do concelho de Matosinhos com 3,75 km2 de área e cerca de 5.600 habitantes (fonte INE, 2014). Em 2013, no âmbito de reforma administrativa nacional, formou uma nova freguesia denominada “União de Freguesias Perafita, Lavra e Sta. Cruz Bispo”. À memória ressalta o património histórico do Monte de S. Brás, Homem da Maça e seu bicho, Quinta de Santa Cruz e Ponte Romântica do Carro. Foi escolhida para acolher o “Parque Diversões Raf Park”. Um projecto para reavivar o conceito de feira popular e parque radical. Ideal para os que procuram aventura e adrenalina. O parque abriu portas a 26.06.2012 para fechar quatro meses depois. Várias desculpas foram apresentadas para esconder uma triste realidade: o projecto falhou e o abandono é evidente. O passar dos anos, constantes indefinições políticas e grande força do vandalismo foram implacáveis para com o parque. Completamente pilhado de tudo que tem valor. É assim que o recinto se apresenta. Um foco de perigo para incêndios, dado o crescimento visível de matagal e insegurança para os romeiros do Monte S. Brás.

Desde 2011, o lugar foi escolhido para acolher um projecto megalómano. A plataforma logística teve como objectivo a criação de dois pólos industriais: o Pólo Gonçalves (Sta. Cruz) e o Pólo Gatões (Guifões). Expropriações urgentes, construções desmesuradas e muito dinheiro para desperdiçar. Foi esta a fórmula que modificou o cenário bucólico e o transformou num postal ilustrado da Síria. Hoje é sabido que este projecto falhou redondamente e será quase impossível reparar as cicatrizes territoriais. A via principal de acesso rodoviário – destinado a retirar a circulação de camiões do centro da cidade – termina, ou inicia, na Rua das Escolas (curiosamente construída para acesso à escola). Há passeios para os peões que terminam abruptamente numa parede, obrigando à circulação pela estrada. Há sinalização vertical que é desrespeitada constantemente. E, contudo parece que a conivência das autoridades é um dado adquirido.

A passagem pela Alameda Infanta Dona Mafalda é quase obrigatória. É o ponto de acesso às novas ruas que foram construídas para o tráfico de trânsito pesado. Baptizada localmente como a “Rotunda da vergonha”, reflecte a falta de capacidade, das entidades responsáveis, em cumprir as mais básicas regras do código automóvel. A Rotunda está pintada no asfalto! Mais depressa se confunde com uma obra decorativa. As passadeiras dos peões terminam no centro da rotunda. Para onde vão? Não interessa. É a política do desenrasque e ausência de responsabilidades.

A visita está terminada. É bem patente a tristeza e amargura do nosso guia. Não é esta a visão que teve há quatro décadas. Não é este o futuro que pretende. Tem muita dificuldade em lutar contra as mentalidades politiqueiras locais que recusam admitir a falha do projecto megalómano de José Sócrates e não têm capacidade administrativa e financeira para devolver alguma qualidade de vida aos moradores cercados pelos contentores, camiões, confusão e barulho ensurdecedor. Mas que cumprem, como qualquer outro, com as elevadas obrigações fiscais.
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06/04/2015

FLORBELA ESPANCA

Nascida em Vila Viçosa (1894.12.08), foi uma poetisa portuguesa. A sua vida, de apenas trinta e seis anos, foi plena, embora tumultuosa, inquieta e cheia de sofrimentos íntimos que a autora soube transformar em poesia da mais alta qualidade, carregada de erotização, feminilidade e panteísmo.

Flor Bela Lobo. Assim baptizada com ausência de progenitor reconhecido. Apesar de ser filha biológica de João Maria Espanca e Antónia Conceição Lobo (mãe de aluguer à época) em virtude de a sua mulher não poder conceber. Foi, contudo, criada em casa do seu pai biológico e da esposa Maria do Carmo Inglesa (madrinha de Florbela). O apelido Espanca é-lhe atribuído após reconhecimento de paternidade (a ela e seu irmão) posteriormente à morte da esposa.

(1903) As suas primeiras composições poéticas: o poema "A vida e a Morte". O soneto em redondilha maior em homenagem ao irmão Apeles. Um poema escrito por ocasião do aniversário de seu pai: "No dia d' annos".

(1907) Escreveu o seu primeiro conto. "Mamã!". No ano seguinte, com apenas vinte e nove anos, a sua mãe Antónia, faleceu. Ingressou no Liceu Masculino André de Gouveia, em Évora, onde permaneceu até 1912. Tomou conhecimento das obras de Balzac, Dumas, Camilo Castelo Branco...

(1913) Em Évora, casa com o seu colega de escola, Alberto de Jesus Silva Moutinho. Os anos seguintes ficam caracterizados por dificuldades económicas e constantes mudanças de habitação.

(1916) A poetisa reuniu uma selecção da sua produção, inaugurando o projecto "Trocando Olhares". A colectânea de oitenta e cinco poemas e três contos serviu para, mais tarde, ser o ponto de partida para futuras publicações. Na época, as primeiras tentativas de promoção falharam.

(1917) Sofreu as consequências de um aborto involuntário, que lhe teria afectado os ovários e pulmões. Repousou em Quelfes (Olhão), onde apresentou os primeiros sinais sérios de neurose.

(1919) Saiu a sua primeira obra "Livro de Mágoas", um livro de sonetos. A tiragem, de duzentos exemplares, esgotou-se rapidamente.

(1920) Separada de Alberto Moutinho, desde 1918, pouco tempo após o seu primeiro aborto involuntário, passou a viver com António José Marques Guimarães, alferes da Guarda Republicana. Fixou-se em Matosinhos. O divórcio só viria a ser reconhecido em Janeiro de 1921. Após o casamento, passou a viver no próprio destacamento, no Castelo da Foz.

(1923) Separou-se do seu segundo marido em Novembro. Na sequência de maus tratos infligidos e de novo aborto involuntário. O processo de divórcio inicia-se em 1924 e decretado em 1925. Esta situação abalou-a muito.

(1926) Regressou a Matosinhos, após o seu terceiro casamento, com o tenente-médico Mario Lage (havia sido colega de guarnição de António Guimarães, em 1920, na Foz). Florbela padecia de vários problemas de saúde, tendo sido este médico a tratá-la. Mudaram-se para a casa da família do médico, na Rua 1º Dezembro, em Matosinhos. É aqui que, finalmente, encontra um lar onde todos a tratam bem. Passa as tardes na areia doirada, olhando o mar inquieto e que ela admirava tanto.

(1927) Começou a traduzir romances. No mesmo ano, Apeles Espanca, irmão da escritora, faleceu num trágico acidente de avião. A sua morte foi absolutamente devastadora! Em sua homenagem, escreveu "As Máscaras do Destino". Entretanto a sua doença mental agravou-se, ao ponto de efectuar a primeira tentativa de suicídio.

(1930) Começou a escrever "O Diário do Último Ano". Tentou o suicídio por mais duas vezes, Em Outubro e Novembro, na véspera da publicação da sua obra-prima "Charneca em Flôr", com a ajuda do professor italiano Guido Bottelli!

Não resistiu à terceira tentativa de suicídio, pois foram encontrados, debaixo do colchão, frascos vazios de um soporífero que tomava regularmente. No dia do seu 36º aniversário, faleceu em casa. Na certidão de óbito, pode ler-se "edema pulmonar", como causa. Depois das exéquias fúnebres, foi a sepultar no Cemitério Sendim.

(1949) O "Orfeão de Matosinhos" colocou uma placa, em gesto de homenagem, na casa onde a poetisa viveu, trabalhou, e morreu.

(1964) A 17 de Maio, os seus restos mortais foram trasladados para a sua terra natal em Vila Viçosa.

(2015) A placa ainda existe na fachada do edifício. Que apresenta um elevado estado de degradação. O património encontra-se abandonado, esquecido e devoluto...
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06/10/2014

JAKOB MAERSK

O petroleiro "Jacob Maersk", durante manobras no Porto de Leixões, perdeu potência e encalhou. Após a entrada de água nos tanques começou a expulsar, a partir do tanque de ventilação, combustível para o ventilador da sala de máquinas. Os vapores deram origem a uma enorme explosão que iniciou o incêndio. De um grupo total de 46 pessoas, 7 pessoas morreram e 6 nunca foram encontradas, tendo ficado presas na sala de máquinas, em 29 de Janeiro de 1975.
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25/09/2014

OS POPULARES SRA.HORA

(1986) "Os Populares da Senhora Hora"
(António Pinto Santos)


Um grupo de 10 amigos, decidiu fundar a Comissão de Festas Sanjoaninas, denominada por "Os Populares da Senhora da Hora". O centro das festas situou-se entre a Avda.Fabril do Norte e a Rua do Sobreiro, na Senhora da Hora, local de residência de vários elementos da comissão. Com ajuda voluntária de outras pessoas, conseguiram montar um palco para as festividades e um edifício de apoio (refeitório) para alimentação com comida regional. O "Restaurante a Floresta" (ainda em funcionamento!) serviu como sede da Comissão de Festas. Durante o mês de Junho (Sextas, Sábados e Domingos) celebraram as festas sanjoaninas, abrilhantados pelo conjunto musical "Mosaico", entre outros convidados musicais, como o Rancho Típico de Esposade, Banda Filarmónica de Argoncilhe, Grupo Cavaquinhos de Braga, Grupo Bombeiros Voluntários Fafe, etc.

(1987) Depois do sucesso e saldo positivo, do primeiro ano, resolveram continuar a animar as pessoas da Senhora de Hora (e não só!), com a sua simpatia, dedicação, alegria e contagiante boa disposição! O edifício para a alimentação recebeu melhorias. Uma nova decoração! O palco recebeu novos equipamentos, e os convidados musicais também estiveram à altura. Inclusive houve fogo-de-artifício! Apesar do intenso trabalho de preparação e logística, os elementos da Comissão de Festas, não esmoreceram e deram sempre o seu melhor em prol das pessoas da comunidade local. Para recompensar o esforço de todos os colaboradores e respectivas famílias, no final do mês, organizaram um passeio-convívio.

(1988) Quando se preparavam para celebrar o seu terceiro ano de actividade, receberam, por carta, uma indicação (da C.P.) que as habitações circundantes seriam demolidas, devido à preparação para a chegada do Metro do Porto, e que perante tais condições, não seria possível continuar a celebrar as festividades naquele local. Com grande tristeza e mágoa, os membros da Comissão de Festas, resolveram não procurar um outro local e, como tal, encerrar a Comissão de Festas e respectivas festividades.

(2001) Os membros da Comissão, foram contactados pelo Sport Clube Senhora da Hora, presidido pelo Sr.Vasco Carvalho (ex-patrocinador da Comissão de Festas), a dar conta das enormes dificuldades financeiras que o clube atravessava. Inclusive com proibição à inscrição de jogadores. Sempre com o objectivo de ajudar as pessoas da "terra", os membros da Comissão de Festas, reuniram e resolveram oferecer o montante disponível, em conta bancária, que rendia juros desde o encerramento. Foram, na altura, entregues ao Clube de Futebol, cerca de 2.500,00 euros.
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28/07/2014

UM TEXTO MARCANTE

"Em Matosinhos, nos últimos anos, parece tudo ruir. Foi com esta frase que um jovem, quadro de Matosinhos, abriu, há dias, a sua página no Facebook. Analisada bem a situação ela transmite um estado de espírito. A realidade infelizmente corresponde e só um discurso, bem elaborado, mas muito longe do ambiente que respiramos, consegue disfarçar esta cruel situação. Matosinhos tem perdido quase tudo.

Perdeu emprego. "Perde" os quadros jovens que abandonam a sua terra à procura de emprego. As famílias a endividam-se. A pesca esvazia-se. Matosinhos-Sul perverte-se. O Leixões, mas também o Leça e o Infesta, correm sérios riscos. Perdeu-se Serralves, o museu das conservas, o museu da cidade, o centro de ciências do mar, o museu de arquitectura. Até o Centro de Arte Moderna Geraldo Rueda, inaugurado, com pompa e circunstância, por Passos Coelho e José Maria Aznar, não resistiu mais que dois anos e também se perdeu.

Agora Matosinhos está perto de perder o respeito e a afectividade de Siza Vieira e um dos preciosos acervos artísticos e técnicos. Tal como acontece com talentosos jovens quadros de Matosinhos que "fogem" para o estrangeiro à procura de trabalho que não encontram na sua terra, também o espólio pessoal e técnico do "arquitecto do mundo", Siza Vieira, poderá ir para outros lados.

Perdeu-se o espólio de Alcino Soutinho e Fernando Távora que seguiu para a Fundação Marques da Silva, da Universidade do Porto, com os Herdeiros a transmitirem "desencanto" e "tristes" com "a Câmara e atitudes do presidente". Os contratos assinados, com cerca 15 arquitectos, para a doação de espólios caducou e nada foi feito. O museu de arquitectura, nos últimos dez anos, apenas mudou de nome. Deixou de ser museu para ser casa de arquitectura e está praticamente colocado no "arquivo morto".

Em 25 de Junho de 2009, "para o número 582 da Rua Roberto Ivens, em Matosinhos, confluem alguns dos mais emblemáticos arquitectos do País, designadamente Siza, Souto Moura, Soutinho, entre outros, governantes do Governo de Sócrates, designadamente, o ex-ministro da Cultura, Pinto Ribeiro e os autarcas, todos os autarcas, na altura eleitos pelo PS agora todos contra o PS. O trânsito fica interrompido, filas de carros de alta gama, chamavam à atenção. Era a inauguração do Centro de Documentação Siza Vieira na antiga residência do arquitecto. Foi uma festa. Segundo reportagem da Visão "...esta seria a sede provisória e embrião da futura Fundação Casa da Arquitectura, a edificar numa encosta do concelho, em terrenos cedidos pela APDL, sob projecto do próprio Siza. O edifício teria, anunciara-se, 11 mil metros quadrados, incluindo biblioteca, sala de conferências, auditório, gabinete de estudo e manutenção de espólio, área expositiva,arquivo, cafetaria e parque de estacionamento, na maioria áreas públicas divididas por oito pisos. Grandioso? Sim. Era tudo grandioso. Governo Sócrates e Câmara não faziam por menos. Sim tudo grandioso, mas apenas nos discursos. No início, admitira-se um "custo de 20 milhões de euros, com recursos a fundos comunitários, mas as coisas não iriam passar-se exactamente assim."

Bom demais, não acham?? Havia mais. "Quinze arquitectos assinam, na ocasião, um protocolo com a autarquia, no qual manifestam intenção de ceder os respectivos espólios à futura Associação..." Siza emocionou-se e manifesta uma grande alegria por ser dado o "primeiro passo para o arranque da casa da arquitectura" que antes era Museu. Ficou entusiasmado. Viajou, para se inspirar, por importantes museus de arquitectura do mundo, Moscovo, Frankfurt, Roterdão e Montreal. Tudo Museus, mas em Matosinhos, para se marcar a diferença, chamar-se-ia Casa de Arquitectura. Em 2011, Siza, apresentou o projecto e maqueta a outra ministra de Sócrates (ministra da cultura Gabriela Canavilhas).

Álvaro Siza Vieira sempre considerou que "a Casa de Arquitectura é algo necessário para não se perder o arquivo arquitectónico nacional". O Governo de Sócrates foi mais longe ao afirmar "... A Casa da Arquitectura é um tributo aos grandes arquitectos que nasceram no norte e que emprestaram o seu nome ao prestígio que Portugal granjeia do ponto de vista internacional." Tudo muito bonito. Bons discursos, mas, como se lê na Visão, ainda não havia casa. Nem museu. Nem sequer primeira pedra. Nada. Só sombras. Discursos. Promessas. Exercício da "ciência" da ficção. "Não tinha passado dois anos sobre aquele final de tarde promissor, no dia dos 76 anos de Siza, e já os custos estimados, pela autarquia, para a obra tinha mais do que duplicado." Passados cinco anos, nem 20, nem 43 milhões. Nada. Mesmo nada. Existem notícias, papel, discursos, mais discursos, promessas, muitas promessas, com outras tantas ilusões. Um autentico exercício de ficção. Tal como a delegação de Serralves, o museu das conservas, o museu da cidade, o Centro de Arte Moderna Geraldo Rueda, também o museu ou casa (como queiram) de Arquitectura, ficará para a história como um "museu de papel no arquivo morto" para os nossos filhos e netos tentarem saber como é isto possível acontecer. Um dia ainda vou ouvir um discurso onde se afirma: "se A. Costa ganhar teremos museu". Perante tanta evidência e factos inequívocos começamos a perceber o alcance da frase da autoria de um quadro jovem Matosinhense quando, de forma expressiva, escreveu na página do Facebook: "Em Matosinhos, nos últimos anos, parece tudo ruir..."

(NARCISO MIRANDA, in "Jornal Matosinhos"
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